Veleiro Aysso passa por reforma para a luta por um futuro mais sustentável
Nas décadas de 1980, 1990 e 2000, o Aysso foi a nossa embarcação - peça fundamental na realização de muitos sonhos. Foi com ele que completamos a primeira e a segunda voltas ao mundo, que buscamos e encontramos o primeiro submarino naufragado na costa brasileira durante a Segunda Guerra Mundial, o U-513, e que vimos nossos quatro filhos crescerem integrados aos mares e oceanos do planeta.
Mais tarde, construímos o veleiro sustentável Kat, e o Aysso assumiu o que seria, até então, sua última missão: participar do filme "Pequeno Segredo", inspirado na nossa história com a Kat, sob direção de David Schurmann. Após as filmagens em Santa Catarina, o Aysso seguiu para a Marina Itajaí, onde permaneceu por um tempo e pôde assistir ao nosso retorno e à conclusão da nossa terceira volta ao mundo.
Seu destino, a partir dali, no entanto, não seria a aposentadoria, mas uma nova jornada - e com propósito. Para isso, seria necessária uma grande reforma. E, como todo sonho, essa transformação viria acompanhada de muitos desafios. Mas, como sempre digo: a vida é um desafio. E não há limites para quem tem perseverança e vontade de viver.
Neste momento, encontro-me em um estaleiro em Biguaçu, participando pessoalmente da reforma do Aysso. É emocionante ver a renovação desta embarcação que, junto conosco, testemunhou a crescente invasão de resíduos plásticos nos oceanos. Foi a bordo do Aysso que, no final dos anos 1990, chegamos à isolada Henderson Island, no oceano Pacífico, e nos deparamos com embalagens do mundo todo poluindo aquele paraíso remoto.
No segundo semestre, espero estar novamente com o Aysso - que, em tupi-guarani, significa "formoso" - de volta ao mar. Sua primeira missão será chegar a Belém, ao lado do veleiro Kat, para integrar as ações da Voz dos Oceanos na COP30. Nesta nova fase, desejo que o Aysso navegue por ondas de esperança, consciência, engajamento e transformação. Se, com ele, testemunhamos os primeiros sinais da poluição plástica, quero que agora, com ele e o Kat, possamos navegar por oceanos mais limpos e saudáveis.
Depois de uma década sonhando com o retorno do Aysso, vejo este sonho se concretizando - fruto da perseverança e da certeza de que nunca é tarde para embarcar em uma nova aventura. Essa convicção me lembra a fascinante história do meu amigo americano Harry Hackel Jr., que conheci em 1993, na África do Sul. Na época, ele tinha 78 anos.
Harry havia se aposentado aos 56 e, em seguida, começou a reformar seu veleiro - uma embarcação de 32 pés (cerca de 9,77 metros). Após dois anos de trabalho, a embarcação ficou pronta e ele partiu para o mar com sua esposa. Por 11 anos, viveram juntos muitas aventuras. Até que ela adoeceu com um câncer de mama e faleceu. Apesar da dor da perda, Harry continuou navegando, sozinho, pelo mundo.
Eu, que sempre viajei em família ou com as tripulações das nossas expedições - com a Voz dos Oceanos -, perguntei a ele como conseguia se aventurar sozinho. Ele respondeu que não havia segredo: apenas evitava rotas de navios, para reduzir o risco de colisões e poder dormir à noite sem ninguém de plantão.
Ao escurecer, recolhia todas as velas e pendurava um grande lampião de querosene na proa, emitindo uma luz forte. Então, ia para o interior do veleiro, onde jantava e descansava. Ao amanhecer, preparava o café, içava as velas e seguia viagem. Em sua rotina, incluía momentos de leitura - livros de história, poesia e mistério - e uma pequena extravagância: um cálice de Martini por dia, sempre às 16 horas.
Harry deu duas voltas ao mundo, capotou duas vezes - na costa de Madagascar e no Japão -, mas jamais desistiu dos seus sonhos. Lembro que, na época, ele era a pessoa mais velha a completar uma circum-navegação. E, aos 92 anos, ainda continuava navegando.
A volta do Aysso é a concretização de mais um sonho. Ele também estará vinculado à Voz dos Oceanos e a projetos de educação ambiental ao longo da costa brasileira. A bordo do Aysso e do veleiro Kat, durante a COP30, renovaremos a esperança de um futuro possível - um futuro de saúde, respeito e conservação do nosso planeta Água.
Opinião
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