Sérios problemas da Virada Cultural 'desaparecem' na cobertura do evento

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A ausência de uma análise crítica e apurada sobre a Virada Cultural de São Paulo revela que sérios problemas "desaparecem" na cobertura do evento. Muita coisa está "passando batido", sem qualquer questionamento.
Não encontrei, por exemplo, qualquer comparativo sobre a publicidade oficial do evento que afirma que a edição de 2025 da Virada Cultural de São Paulo é a maior da história.
Uma mentira que qualquer cidadão da cidade na faixa dos 30 e poucos anos de idade pode constatar. Além disso, um claro desrespeito a todos os trabalhadores da cultura de São Paulo que participaram da construção desse marco cultural tão importante e que fizeram Viradas muito maiores e mais abrangentes que a atual.
Outro ponto que passa batido é o orçamento do evento. Conforme divulgado, são R$ 54 milhões investidos na Virada desse ano, podendo atingir R$ 59 milhões com suplementações orçamentárias. Segundo números oficiais, esse valor está concentrado na viabilização de 21 palcos e nas atrações que se apresentarão neles.
Acho muito importante que exista todo esse recurso disponível para essa atividade cultural tão tradicional, mas não consigo entender por que temos tão poucos palcos, em comparação com edição anteriores, e ao mesmo tempo um orçamento tão maior.
Em 2019, por exemplo, com 250 pontos de atividades espalhados e 1.200 atrações, o orçamento do evento foi inferior a R$ 20 milhões. Onde estão as matérias que destrincham esse assunto?
Mais um aspecto que mereceria atenção é a divulgação da programação acontecendo a apenas uma semana do evento. É muito pouco tempo, uma barbaridade. Mesmo com toda mídia comprada e conteúdos pagos em TVs, rádios, jornais, revistas e influenciadores, não existe nenhum festival no mundo que pratique esse tipo de comunicação.
É uma irresponsabilidade gastar todo esse orçamento, com tão pouco tempo de divulgação e assimilação da programação por parte da população.
No passado, todas as instituições culturais de São Paulo já se envolveram na Virada. Sesc, Sesi, Masp, IMS, Itaú Cultural, Centro Cultural da Fiesp, entre outras, faziam programações especiais e muitas delas ficavam 24 horas oferecendo seus conteúdos. Até a Avenida Paulista já fechou para carros e abriu para a população em plena madrugada.
Hoje em dia, na dita maior edição da história, nem o Theatro Municipal participa da programação. Quem se lembra das históricas noites de Virada Cultural em nosso mais nobre palco? Grandes nomes tocando seus mais emblemáticos discos, ocupação permanente ao longo de todo o evento.
Não são assuntos para uma crítica contundente sobre o envolvimento da estrutura cultural da cidade, nesse que seria seu principal momento de celebração?
Isso tudo ajuda a explicar a baixa relevância do evento nos dias de hoje. Sem demérito dos grandes artistas escalados — que não têm nada a ver com isso —, mas a Virada não apenas deixou de ser o principal evento da cidade, como não é nem sequer o único grande evento do seu final de semana.
Temos outros festivais privados acontecendo em São Paulo — sem falar da nossa enorme programação rotineira — ao mesmo tempo em que acontece a Virada Cultural. Isso por si só, já caracteriza todo esse contexto de menor importância do evento e deveria ser objeto de reflexões sobre a agenda cultural da cidade.
Por que afinal, produtores privados nem se preocupam mais com o impacto da Virada Cultural e marcam seu eventos no mesmo final de semana que ela acontece?
Fica aqui um chamado para que se criem condições estruturais para que o jornalismo cultural reapareça e faça jus à sua enorme tradição. Essa é uma reflexão que vai muito além da cobertura da Virada Cultural. A responsabilidade e vocação do jornalismo é fundamental para o fortalecimento da nossa cidadania e ampliação do censo crítico em relação às nossas políticas culturais
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